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Nanopartículas de prata são eficazes no tratamento da cárie
Formulações à base de AgNPs são capazes de paralisar a formação da cárie dentária
Por Raiane Andrade
As nanopartículas de prata (AgNPs) têm sido utilizadas como agentes capazes de interromper a ação da cárie dentária sem uso de broca. Um estudo recente, com participação de pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), avança nesse tema e aponta que as AgNPs são capazes de penetrar nos túbulos dentinários. Estes, por sua vez, são canais microscópicos presentes na dentina (estrutura interna do dente localizada abaixo do esmalte). A descoberta está documentada no artigo “Silver nanoparticles penetration in dentin: Implications for long-term caries arrestment” ("Penetração de nanopartículas de prata na dentina: Implicações para o tratamento de cáries a longo prazo"), publicado originalmente em inglês, em junho de 2022, na revista Materialia, v. 24.
Realizado de forma conjunta, o trabalho tem como autores o professor André Galembeck e a doutoranda Maria Clara Müller de Andrade, ambos vinculados ao Departamento de Química Fundamental (DQF) do Centro de Ciências Exatas e da Natureza (CCEN) da UFPE. E também contou com a colaboração da professora Aronita Rosenblatt, da Faculdade de Odontologia de Pernambuco da Universidade de Pernambuco (FOP/UPE).
A estrutura dental é composta tanto pelo esmalte (parte mais externa e dura) quanto pelo complexo interno constituído pela dentina, que envolve a polpa (tecido mole composto por nervos e vasos sanguíneos). A cárie dentária é formada progressivamente a partir do acúmulo da placa bacteriana na superfície do esmalte dental, provocando o seu amolecimento, e consequentemente as bactérias patogênicas penetram nos túbulos dentinários e se multiplicam. Desse modo, as lesões cariosas podem afetar as camadas mais profundas do dente e causar infecções.
A ação cariostática se refere a uma atividade que ajuda a paralisar a formação de cárie dentária. Essa ação pode ser realizada por diversas substâncias que atuam em diferentes etapas do processo. O artigo demonstra que as AgNPs podem penetrar nos túbulos dentinários e permanecer na estrutura dentinária como uma fonte duradoura e constante de íons Ag+, impedindo a invasão bacteriana futura e, portanto, prevenindo o desenvolvimento de cáries.
O professor André Galembeck, que realiza pesquisas sobre o assunto desde 2010, ressalta o poder que as nanopartículas de prata têm como agente antimicrobiano. Para a produção da formulação à base de AgNPs, testes foram realizados em laboratório para verificar a ação microbiológica em ensaios in vitro para que, posteriormente, fossem realizados ensaios clínicos baseados em sua aplicação. “Temos evidências de que o material desenvolvido em nosso laboratório [Laboratório de Compostos Híbridos Interfaces e Coloides] é capaz, além de paralisar, de prevenir a formação de cáries”, evidencia o pesquisador. “As estimativas mostraram que a quantidade de partículas que penetram nos túbulos [dentinários] é suficiente para paralisar a cárie”, completa.
Foi possível constatar que as AgNPs conseguem penetrar nos túbulos dentinários e apresentam a tendência de não se acumularem na superfície. À medida que o tempo de exposição é mais longo, maior é a profundidade de penetração das AgNPs. Além disso, a pesquisa mostra que houve agregação de AgNPs quando partículas menores foram aplicadas por intervalos de tempo mais prolongados.
Segundo Galembeck, os dois mecanismos principais de ação da prata antibacteriana se configuram na capacidade que essas partículas possuem em danificar a parede celular – responsável por proteger a célula do ambiente externo – e no fato de a prata se ligar ao DNA, de modo a impedir a sua replicação. Esses fatores fazem com que seja possível aniquilar a bactéria causadora da cárie.
É referenciado no artigo que, durante o primeiro ensaio clínico realizado em um estudo anterior, as formulações baseadas em AgNPs foram capazes de interromper lesões cariosas em crianças. Dessa maneira, constatou-se que, após uma semana da aplicação, houve a redução significativa de 81% da deterioração dental. Depois de 12 meses, o percentual foi de 67%. Isso com uma única aplicação, sem perfuração, restauração ou anestesia local. Logo, percebe-se que os coloides – misturas heterogêneas, embora visualmente apresentem um aspecto uniforme e homogêneo – de AgNPs têm um potencial promissor enquanto abordagem alternativa e menos invasiva para o tratamento de cáries dentárias no público infantil, visto que é um processo indolor feito sem o uso de brocas.
EXPERIMENTO – Os dentes utilizados no estudo mais recente foram provenientes do Banco de Dentes Humanos da UFPE, ligado ao Departamento de Prótese e Cirurgia Bucofacial, Campus Recife. Ao remover o terço incisal da coroa dos dentes com o auxílio de um disco de diamante rotativo, a dentina foi exposta com o intuito de simular lesões de cárie oclusal (superficial). Posteriormente, houve a aplicação de dois coloides de AgNPs na superfície da dentina. Uma amostra continha nanopartículas esféricas, enquanto a outra, uma mistura de nanopartículas esféricas, triangulares e em forma de bastão. Para observar a profundidade de penetração e a quantidade das AgNPs nas áreas internas da dentina, as amostras foram analisadas por microscopia eletrônica de varredura (SEM) e microscopia eletrônica de varredura com feixe de íons focalizados (FIB-SEM). Esta última permite a investigação dos dentes humanos em micro e nanoescala, revelando aspectos morfológicos detalhados do esmalte e tecidos dentinários de maneira inédita. Os experimentos de FIB-SEM foram realizados no Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano).
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Professor André Galembeck
andre.galembeck@ufpe.br