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Padre Mestre Ibiapina

Ilustração do Padre Ibiapina – Fonte: Diário do Nordeste

Ducentésimo décimo quinto aniversário do Padre Mestre Ibiapina, como era conhecido José Antônio Pereira Ibiapina, que foi professor, deputado federal, chefe de polícia, juiz de direito e advogado, antes de se ordenar padre e começar seu trabalho missionário pelo interior do Nordeste.

Natural do norte da província do Ceará, José Antônio Pereira Ibiapina, nasceu na fazenda Morro da Jaibara, em São Pedro de Ibiapina, na Vila de Sobral, a 5 de agosto de 1806 e filho de Francisco Miguel Pereira Ibiapina e de Dona Theresa Maria de Jesus. Neto paterno de Manoel Pereira de Sousa e Teresa Maria de Assunção e neto materno de Antônio Pereira de Azevedo Bisneto e Maria Furtado de Mendonça. O “Ibiapina” foi uma homenagem do seu genitor ao vilarejo que o acolheu nos primeiros anos de seu casamento, por isso decidiu acrescentar o nome do local ao patronímico dos filhos. Ibiapina é o terceiro dos oito filhos do casal e o primeiro a portar esse sobrenome.

Residiu parte de sua infância na cidade do Icó, em 1816, para onde transmigraram a família dele, já que o genitor fora designado tabelião, passou a estudar na escola particular do professor José Felipe, iniciando assim sua educação formal, nessa região permanecendo até 1819, quando o seu pai foi transferido para ocupar o mesmo cargo na Comarca do Crato, nessa época tinha idade de 13 anos, onde Ibiapina frequentou aulas de religião com o vigário José Manuel Felipe Gonçalves. Em 1820, foi para cidade de Jardim - Ceará, estudou latim com o mestre Joaquim Teotônio Sobreira de Melo. E terminou o curso de humanidades.

Em 1823, acompanha seus genitores que se mudam para Fortaleza. E é mandado logo em seguida para Olinda, destinado ao seminário e ao sacerdócio, com o objetivo de se tornar padre. Ibiapina, porém, constrangido pelo ideário racionalista e revolucionário do Seminário de Olinda, retira-se de lá e vai viver no Convento da Madre de Deus, dos padres oratorianos, no Recife.

Aos 17 anos de idade, José Antônio Pereira Ibiapina, perde a sua mãe de um parto prematuro em 1823, aos 19 o pai que foi preso, condenado e fuzilado em praça pública, no dia 7 de maio de 1825, em Fortaleza, junto com o Padre Mororó. Aos 20 anos seu irmão mais velho, de Ibiapina, Raymundo Alexandre, que também participara, teve exílio perpétuo no presídio de Fernando de Noronha, onde morre tragicamente.

Ibiapina deixa o convento e retoma ao Ceará para cuidar dos irmãos menores, para assumir e manter financeiramente a família, tendo que interromper seus estudos. Martiniano de Alencar, revolucionário de 1817, que o pai de Ibiapina brigava, veio em ajuda de sua família. Com o auxílio recebido, retorna algum tempo depois ao Recife com os irmãos, voltando a estudar no Seminário de Olinda, enquanto isso reside no mosteiro de São Bento.

Tendo-se dado a criação em 1827 dos cursos jurídicos no Brasil, José Antônio Pereira Ibiapina, cujos primeiros estudos feitos no Convento da Madre de Deus e no Seminário o inclinavam à vida sacerdotal, preferiu frequentar a Academia de Olinda. 

Em 1828, matriculou-se novamente no Seminário de Olinda, sendo aprovado para o curso de Ciências Jurídicas e Sociais de Pernambuco, passando a morar no Mosteiro de São Bento, em Olinda. Segundo o jornal Diário de Pernambuco, onde apresenta o nome José Antônio Pereira na Lista dos estudantes do 2º ano do Cursos de Ciências Jurídicas e Sociais, matriculados na Faculdade de Direito do Recife no ano de 1829, na qual teve com companheiros Eusébio de Queirós Coutinho Matoso da Câmara, Firmino Pereira Monteiro, João José Ferreira de Aguiar, Lourenço Trigo de Loureiro, entre outros.

Fez sua matrícula de 3º ano em 29 de março de 1830 e a matrícula do 4º ano no dia 14 de março de 1831. E aos 09 de outubro de 1832, neste mosteiro de São Bento procedendo-se aos atos do 5º Ano pelos Doutores Antônio José Coelho e Pedro Autran da Matta e Albuquerque, sob a Presidência do Dr. Antônio José Colho distribuído os regulados os votos de aprovado plenamente. Bacharelou-se em Olinda na primeira turma da Academia de Direito que continha 41 estudantes oriundos de vários Estados brasileiros e de outros países como Angola e Portugal, em 1832. Recebeu o grão de bacharel em ciência Jurídicas e Sociais, por plena aprovação em todos os exames no 09 de outubro de 1832.

Registro da Carta do Bacharel Formado José Antônio Pereira Ibiapina – Acervo do Arquivo da FDR

Após a conclusão do curso, seu nome foi indicado para ser professor de Direito Natural, por proposta unânime da congregação dos professores. Aos 27 de março de 1833, neste mosteiro de São Bento e Casa destinada para o Curso Jurídico, presente o diretor interino Manoel Ignácio de Carvalho compareceram os Bacharéis José Antônio Pereira Ibiapina, Francisco Joaquim das Chagas e Lourenço Trigo de Loureiro perante a Congregação de Lentes e foi lido o aviso de 05 de fevereiro de 1833 e Decreto do 01 de março de 1833, em virtude do qual houve a Regência por bem nomeá-los para servir interinamente de substitutos deste curso Jurídico.

Posse de Professor Substituto José Antônio Pereira Ibiapina – Acervo do Arquivo da FDR   

Lecionou Direito Natural a João Maurício Wanderley (Barão de Cotegipe), Zacarias de Goes e Vasconcellos, Álvaro Tibério de Moncorvo Lima, Miguel Fernandes Vieira, Manoel Theophilo Gaspar de Oliveira, Pedro Pereira da Silva Guimarães, Felippe Raulino de Souza Uchôa e João Carlos Pereira Ibiapina.

Para aproveitar o período de férias escolares viajou então para rever a família e amigos no Ceará, foi o momento que conheceu Carolina Clarence de Alencar, filha de Tristão Gonçalves de Alencar Araripe (chefe confederado de 1824) e Ana Porcina Ferreira de Lima, e sobrinha do Padre Martiniano de Alencar, pai do romancista José de Alencar, por quem se apaixonou, marcando casamento para o próximo período de férias.

Em pleno exercício do magistério, recebe a notícia de que fora eleito Deputado Geral pelo Ceará, tendo sido o candidato mais votado (233 votos), para a legislatura de 1834-1837, para representar o Ceará na Assembleia Legislativa Nacional, no Rio de Janeiro. Era o tempo do governo de Diogo Feijó, na Regência, quando os liberais moderados, a que era filiado na província, dominavam como 7 de Abril. Ainda no final deste ano, por Carta Imperial de 13 de dezembro, fora nomeado Juiz de Direito da recém-criada comarca de Campo Maior (Quixeramobim) da província do Ceará.

Contudo, tendo prosseguido o seu ensino até o final do ano letivo quando então pede exoneração, no que foi atendido pelo Decreto da Regência de 20 de dezembro de 1833. Aos 27 anos, outro golpe veio machucar a vida de Ibiapina: regressando à sua província natal com o próposito de casar-se com sua noiva Carolina Clarence de Alencar, descobre que a mesma fugiu antes para casar com o primo Antônio Ferreira Lima Sucupira. Mesmo com essa decepção amorosa, Ibiapina viaja imediatamente para o Rio de Janeiro, com bastante antecedência, a fim de assumir as funções de Deputado, na 3º Legislatura da Assembleia Geral do Império, cuja posse só ocorrerá no dia 2 de Maio de 1834.

Encerrada a sessão legislativa daquele ano, Ibiapina retorna ao Ceará para assumir por três meses (final de 1834 a março de 1835) o cargo de Juiz de Direito de Quixeramobim, um ano após ter sido nomeado. Nessa ocasião, Ibiapina vai visitar o Padre Martiniano de Alencar, então presidente da província, que o nomeia para exercer também o cargo de Chefe de Polícia da mesma região. Logo o seu desempenho ético e exigente o levaria a conflitos com o executivo provincial e com os soberanos da comarca. Parte então para a Corte e, só no final da sessão de 1835, exonerou-se da magistratura. 

Nesse segundo ano de mandato apresenta projeto propondo a redução do meio circulante para estabilizar a economia e vai progressivamente assumindo atitude de oposição. Em 1836, tinha havido roubo no Tesouro Nacional e era Ministro da Fazenda Manuel do Nascimento Castro e Silva, deputado alencarista do Ceará. Suspeitando deste, Ibiapina apresenta indicação solicitando que o trono o substituísse por alguém mais competente. Na sessão de 1837, foi calma a sua atuação e constitui sua derradeira presença na política. Foi oferecido um ministério e uma presidência de província, contudo, declinou destas nomeações, tal a sua decepção com a vida pública.

Findo assim o mandato de Deputado, abandonada a carreira da magistratura e frustrado o casamento, Ibiapina veio viver no Recife. 

Decidiu portanto empenha-se à advocacia, com escritório num sobrado da Praça do Carmo e com atuação no foro da Capital e do interior. Antes, todavia, inicia sua brilhante carreira de advocacia, atuando por dois anos na Paraíba, onde seu respeito de criminalista assume intensa popularidade. Continua a sua atuação profissional no Recife por toda a década de 1840 a 1850, quando consolida sua reputação intelectual e moral. Em 1850, ocorreu mais uma decepção: perdera uma causa. Devolveu os honorários ao constituinte, distribuiu seus livros jurídicos e abandonou a profissão.

Buscou uma vida retraída em um sítio de sua propriedade, dedicou-se a rezar, meditar, estudar teologia e filosofia, além de fazer caridade, até decidir-se pelo sacerdócio, em 1853. Sugere então ao Bispo Dom João Perdigão a sua intenção de ordenar-se padre, com uma condição: não se submeteria a exames. Isso foi no domingo, dia 12 de julho de 1853. O Bispo, a princípio, impugnou a proposta. Mas no sábado seguinte, dia 18, em virtude da intermediação de amigos, tomaria as ordens menores, e, no domingo, já seria subdiácono. Tudo foi feito em cerimônia privada. No domingo, 26 de julho, recebeu o presbiterado, celebrando a sua primeira missa no dia 29, na Igreja da Madre de Deus. 

O Bispo o nomeia Vigário Geral e Provedor do Bispado. Em 1854, por decreto Imperial, foi nomeado lente de Eloquência Sagrada do Seminário de Olinda, tornando-se professor de História Sagrada e Eclesiástica da instituição, em janeiro de 1855. 

Tais cargos e honrarias não seduziam Ibiapina, que logo renuncia a eles para dedicar-se ao seu projeto missionário de viajar, doutrinar, educar e construir algo concreto para as populações abandonadas dos sertões nordestinos. 

Em 08 de dezembro de 1855, alterou seu nome civil, trocando o sobrenome Pereira pelo de Maria, passando a chamar-se Padre José Antônio de Maria Ibiapina, em homenagem à Imaculada Conceição de Maria. Doou tudo que possuía demonstrando o desapego aos bens materiais e seus livros de Direito foram doados ao curso jurídico de Olinda.

Em 1866, foi nomeado Visitador Diocesano da Paraíba com a tarefa de visitar e supervisionar as atividades da Igreja católica naquela província.

Aos 60 anos de idade, deixou sua carreira de professor para começar seu trabalho missionário pelo interior do Nordeste. Sempre de batina, a pé ou a cavalo, peregrinou por Pernambuco, Rio Grande do Norte, Piauí e Paraíba, catequizando, organizando missões, construindo capelas, igrejas, açudes, cacimbas, poços, cemitérios e hospitais, chegando a fundar mais de vinte Casas de Caridade para moças órfãs, onde elas recebiam educação religiosa e moral, aprendiam a ler, escrever e trabalhos domésticos, além de terem assistência à saúde. Esteve no Ceará entre os anos de 1862 e 1870, em Sobral, sua terra natal, na região norte, depois no Cariri. Também, ensinou técnicas agrícolas aos sertanejos, atuação que inspirou o Padre Cícero e Antônio Conselheiro, e defendeu os direitos dos trabalhadores rurais. Esses projetos missionário foi o rumo que tomou sua vida até o fim dos seus dias.

Aos 67 anos, sofreu uma congestão cerebral a 30 de dezembro 1873. A partir de 1875, com 69 anos, seu estado se agrava, advindo uma paralisia das pernas que o prende ao leito ou à rústica cadeira de rodas - ficou paralítico e não pôde mais deixar a Casa de Santa Fé de Arara, onde tinha estabelecido o centro de sua vida missionária. É daí que continuará escrevendo, aconselhando e provendo suas Casas de Caridade.

Em 1878, institui oficialmente, com declaração passada em cartório, um pedinte para cada Casa de Caridade, com o encargo de recolher doações, a fim de salvar seus protegidos e os que ali buscavam sobrevivência. Seu estado de saúde vai piorando progressivamente e aos 76 anos ainda, faleceu o grande missionário às 15 horas do dia 19 de fevereiro de 1883 na casa de caridade Santa Sé, no no distrito de Santa Fé, no município de Solânea (PB), onde estava recolhido desde 1876.

Aos 11 de novembro de 1925, realizou na Faculdade de Direito do Recife uma cerimônia formal na Galeria dos Lentes Mortos, onde ocorreu a aposição do retrato do Padre Ibiapina. Esse ato foi assistido pelo Dr. Manoel Netto Carneiro Campello - Diretor da Faculdade de Direito do Recife, professores, estudantes e o pessoal do corpo administrativo desta escola superior. 

Retrato do Padre Ibiapina – Fonte: Quadro 10 da Faculdade de Direito do Recife

O padre cearense José Antônio de Maria Ibiapina, que deixou de viver há 138 anos no interior da Paraíba, pode ser o primeiro brasileiro nato a virar santo reconhecido pela cúpula da Igreja Católica no Vaticano. O mesmo comunicou à Igreja do Brasil que Ibiapina foi reconhecido oficialmente pela Congregação para a Causa dos Santos como "servo de Deus" (documento “Nihil Obstat”, datado de 18 de fevereiro de 1992). O título é o primeiro passo para alguém chegar à santidade na Igreja Católica. A Diocese de Guarabira (PB) conduz o processo de beatificação do Padre Ibiapina, considerado o “apóstolo do Nordeste”, já que ele morreu no município de Solânea, no agreste paraibano.


Fontes consultadas:

>> Biblioteca Nacional digital Brasil -  J Lista geral dos estudantes matriculados na Faculdade de Direito do Recife no 2º ano de 1829

>> Biblioteca Nacional digital Brasil -  A Provincia do Espirito-Santo : Jornal consagrado aos interesses provinciaes, filiado à escola liberal (ES)  - 30 de março de 1883

>> Biblioteca Nacional digital Brasil -  J Vanguarda (CE) - 18 de novembro de 1888

>> Biblioteca Nacional digital Brasil -  J Vanguarda (CE) - 18 de novembro de 1888

>> Biblioteca Nacional digital Brasil -  Jornal de Recife (PE) - 12 de novembro de 1925

>> Diario do Nordeste - Católicos vivem a expectativa da beatificação dos religiosos

 >> Fundação Padre Ibiapina - desde 1956 - Patrono

>> Livro de Registros dos diplomas e títulos de todos os empregados do corpo jurídico - 1828 - 1930 - página 13v

>> Registro de diplomas de bacharéis (1832 - 1848) - página 10

>> Revistas do Instituto do Ceará - O Padre Ibiapina

>> Revistas do Instituto do Ceará - Padre Ibiapina, transcripto D’Imprensa, da Parahyba

>> Revistas do Instituto do Ceará - Padre Ibíapina, Traços biográphicos encontrados no archivo da Casa de Caridade de Santa Fé, em Araras

Data da última modificação: 14/09/2021, 21:24