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Indicações por critérios políticos enchem Tribunais de Contas de parentes e indiciados

A dissertação foi defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFPE

Por Renata Reynaldo 

Além de extrapolarem em quase o dobro o limite constitucional do número de conselheiros que podem ser indicados pelo Poder Executivo, nos 27 tribunais de contas estaduais do Brasil (TCEs), dos 186 conselheiros, 56 têm algum grau de parentesco político e, ainda, 40 deles têm ou tiveram pendências com a Justiça. Analisado na dissertação "Tribunais de Contas Estaduais: indicações, perfil dos conselheiros e autonomia das instituições", defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFPE, pelo mestre Audálio José Pontes Machado, o retrato desses órgãos públicos indica que "os indivíduos indicados pelos governadores e Assembleias são mais propensos a serem membros de famílias políticas ou réus em processos criminais".

No estudo, que foi finalizado no início deste ano, sob orientação do professor Mauro Soares, o autor aponta que o teor político das indicações para os conselhos dos TCEs faz com que o cargo seja muito importante na arena política estadual, servindo como recompensa ou válvula de escape para vários políticos, correligionários e parentes dos mandatários. "Os vários benefícios em ser membro da Corte de Contas, como vitaliciedade do cargo, altos salários e gratificações, além de ter poder comparado ao de um desembargador, confirmam a razão de uma vaga ser tão concorrida", explica Audálio.

HIPÓTESES | Partindo de duas hipóteses, o autor da pesquisa buscou verificar se o fato de o conselheiro dos TCEs ser um burocrata indicado diminui as chances de ter parentesco político e/ou processos judiciais e, também, se a autonomia dos TCEs será maior nos estados com maior alternância de poder. A partir da análise dos dados, Audálio atestou que a primeira premissa é verdadeira e acrescenta: "Mesmo sendo designados pelos governadores, os técnicos que se tornam membros do Pleno do Tribunal são menos propensos aos vícios que indivíduos anteriormente na carreira política apresentam."

Quanto à outra sugestão, segundo Audálio não foi possível chegar a resultados significativos. "A criação de um índice de autonomia mais a utilização do indicador de alternância pareciam ser uma saída interessante para tentar observar a relação sugerida na segunda hipótese, principalmente, mas o que se percebeu foi que alguns casos realmente se comportam como esperado; entretanto, uma quantidade considerável de estados se desviam do que supunha a hipótese 2." Para indicar o grau de autonomia nos Tribunais de Contas, o estudo propôs ainda um indicador desenvolvido através da escolha de categorias com pesos diferentes, que totalizarão o máximo de 10 pontos ao final da averiguação dos resultados. 



METODOLOGIA | Na metodologia adotada, o orçamento do TCE conta peso 1; as razões entre o orçamento do TCE e os montantes recebidos pelas Assembleias Legislativas e o estado têm peso 1; quantidade de conselheiros réus em processos judiciais, peso 2; quantidade de conselheiros com parentesco político, também peso 2; e número correto de servidores de carreira nos postos mais importantes do tribunal, peso 4. Fechando a formulação, o autor definiu para cada grupo um escore máximo de 10, mas os valores são multiplicados pelos pesos correspondentes. 

Para explicar o método, a dissertação define que se uma variável obtiver nota 8 e tem peso 1, então o valor será multiplicado por 0,1 e o resultado final será somado com as outras quatro categorias. "Desse modo, as pontuações máximas de cada estrato podem variar entre 1 e 4, chegando ao limite de 10 quando somados. O primeiro grupo classifica os TCEs em relação ao tamanho de seus orçamentos. O peso 1 foi dado pela discrepância que há entre os estados tanto no montante recebido anualmente, quanto nos seus territórios e relevância nacional", reforça Audálio. Há ainda dois aspectos  – o número de conselheiros com formação técnica (burocrata de carreira) e o número de conselheiros desprovidos de vínculo partidário, correligionário ou familiar – considerados para verificar o grau de autonomia dos Tribunais de Contas. 

Dentre vários outros dados apurados na pesquisa, constam que, dos 186 conselheiros, 126 (67,7%) são de origem majoritariamente política, vindo de cargos eletivos ou de direção e assessoramento aos governos estaduais, 51 (27,5%) eram servidores públicos, incluindo 47 técnicos de carreira dos próprios TCEs, e 9 (4,8%) foram nomeados predominantemente pelas relações familiares com governadores ou grandes famílias políticas dentro dos estados. Esses números, para o mestre em Ciência Política, retratam uma faceta relevante do perfil dos membros das Cortes dos Tribunais de Contas Estaduais, nas quais as indicações políticas estão contidas nas regras do jogo e conservam um papel central no funcionamento dessas instituições.

Segundo Audálio, embora muito extenso, o perfil levantado não conseguiu trazer todas as informações pertinentes à discussão. "Não foi possível, por exemplo, quantificar quantos negros, pardos e indígenas são conselheiros, mesmo sabendo que a porcentagem é baixíssima. Outro fato não categorizado foi o número de integrantes do Pleno dos TCEs que possuem ensino superior completo." Quanto às mulheres, identificou-se  que também são sub-representadas, ocupando apenas 25 assentos dos 186 preenchidos, correspondendo a somente 13,4%. À luz dos resultados, o autor constata que "uma democracia de baixa qualificação inerentemente produz um sistema com frágil responsabilização dos governantes e agentes públicos; e, com pouco controle dos representantes por parte da população e de agências especializadas, um déficit democrático fica evidente, desencadeando um ciclo vicioso".

Mais informações

Programa de Pós-Graduação em Ciência Política
(81) 2126.8922 | 8283
ppgcp.ufpe@gmail.com

Audálio José Pontes Machado
audaliomachado@gmail.com

 

Data da última modificação: 22/09/2017, 11:21