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Informações sobre câncer de boca disponíveis na web são de baixa qualidade

Estudo aponta que textos apresentam complexidade de compreensão, o que dificulta a conscientização da população sobre a doença

Por Maik Santos      

Levante a mão quem nunca recorreu ao Google em busca de informações a fim de descobrir a razão, doença e, mesmo, o tratamento indicado ao seu mal-estar, muitas vezes sem verificar a procedência do conteúdo à disposição. Pois bem, em um estudo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Odontologia da UFPE (PPGOdonto), a pesquisadora Kamilla Karla Mauricio Passos detectou que a maior parte do conteúdo sobre câncer de boca disponível na internet é de baixa qualidade. “Essas informações apresentam uma complexidade de compreensão, incompatível com o nível de escolaridade do brasileiro, o que dificulta a conscientização da população sobre a doença”, afirma a autora da dissertação “Avaliação da qualidade da informação sobre câncer de boca em língua portuguesa (Brasil) no Google, Youtube e Instagram.

A partir de avaliação dos textos selecionados, o estudo identificou que os conteúdos são adequados para pessoas de Ensino Médio ou de nível superior, sendo necessário que os usuários tivessem um alto nível de leitura para compreender a informação publicada. Kamilla vê esse dado como algo preocupante, explicando que “segundo o IBGE, apenas 51% da população concluiu o Ensino Fundamental e 15,3% possui nível superior completo”. A autora, que desenvolveu o trabalho sob orientação do professor Danyel Elias da Cruz Perez, também verificou que, quando há predominância de frases curtas e substituição de termos técnicos por expressões mais simples, a informação é compreendida com mais facilidade. “Observa-se que não há um controle sobre as publicações, não há uma fiscalização sobre os conteúdos postados na rede, sendo necessário que os consumidores desenvolvam habilidades para acessar, compreender e utilizar esses conteúdos de forma segura”, avalia. 

O estudo analisou informações disponíveis em 54 sites, 57 vídeos no Youtube e 39 publicações no Instagram. Como critérios para avaliar a qualidade das informações foram utilizados parâmetros de referência do Journal of the American Medical Association (JAMA), como a exibição de autoria de conteúdo de saúde (autores e colaboradores, suas afiliações e credenciais); exibição de atribuição (referências e informações relevantes sobre direitos autorais); exibição de atualidade (data de atualização), e divulgação de propriedade, patrocínio, políticas publicitárias ou conflitos de interesse. Quanto mais critérios contemplados, maior a credibilidade do site ou postagem. Outros referenciais para a qualidade informativa do conteúdo foram o Discern, plataforma on-line que avalia a confiabilidade em informações relacionadas a saúde

CLASSIFICAÇÃO | A autora classificou os sites, vídeos e postagens do Instagram de acordo com a afiliação a profissionais de saúde, órgãos governamentais, generalidades em saúde, enciclopédias on-line, portal de notícias e sites de educação. Os cem primeiros sites a aparecerem relacionados ao termo “câncer de boca” no mecanismo de pesquisa do Google, em fevereiro de 2018, compuseram a amostra inicial. No entanto, após aplicação de critérios de exclusão, a pesquisadora obteve 54 sites para análise. Dezenove desses portais continham matérias jornalísticas sobre a doença, mas nenhum dos sites avaliados contemplou os quatro critérios do JAMA. 

A maior parte dos vídeos disponíveis no Youtube analisados na pesquisa foi considerada moderadamente útil. Isso se deu porque eles mencionavam alguns dos principais fatores de risco, apresentavam algum sinal associado à doença, informavam a respeito do tratamento e eventualmente promoviam a prevenção precoce do câncer de boca. No entanto, salienta a pesquisa que “a maioria dos vídeos era reportagens que estavam hospedadas em canais ligados a emissoras de TV; contudo, 54 vídeos não apresentaram outra fonte de informação e 40 deles não citaram nenhum tipo de fonte. Além disso, entre os vídeos que foram excluídos da análise qualitativa, alguns foram classificados como enganosos, abordando a cura do câncer de boca por uma entidade religiosa ou encorajavam o uso de terapias não comprovadas cientificamente”.

Em relação ao conteúdo das postagens no Instagram, a autora destaca que grande parte delas foi feita por profissionais da área de saúde, ao contrário do que aconteceu com os sites. Nessa plataforma, Kamilla Passos encontrou seis endereços que cumpriam todos os critérios do JAMA. “No entanto, ainda continua sendo um número muito baixo”, avalia. Na pesquisa, a autora explica que o câncer de boca é o 5º tipo de câncer mais comum entre os homens brasileiros, de acordo com a estimativa feita pela Instituto Nacional do Câncer (Inca). A primeira semana de novembro é a Semana Nacional de Prevenção do Câncer de Boca. “Um dos maiores desafios em relação ao câncer de boca consiste na dificuldade do diagnóstico precoce. A maioria dos casos é diagnosticada em estágio avançado. A falha na detecção precoce da doença por parte dos profissionais e a falta de informação e conscientização dos pacientes pode explicar boa parte do atraso no diagnóstico da doença”, explica. Nesse contexto, a internet pode servir como uma importante ferramenta de informação e orientação, mas é necessário estarmos atentos ao conteúdo disponibilizado nela.

Mais informações
Programa de Pós-Graduação em Odontologia (PPGOdonto)
(81) 2126.8817
ppgodonto@gmail.com

Kamilla Karla Mauricio Passos
millakmp@gmail.com

Data da última modificação: 04/09/2023, 08:47